sexta-feira, 1 de maio de 2020

A Generosidade das Mangueiras


A GENEROSIDADE DAS MANGUEIRAS (D. Arbués)

                Desde miúdo, me impressiona muito a generosidade das mangueiras. Conheci esses seres verdes pelos caminhos que me levavam às barrancas do rio. Muitas, sempre me observando lá do alto em seus quintais.

                Pessoalmente, fui conhecê-los melhor quando fui morar com minha avó, em Torixoréu. Senhora Manga Rosa e senhor Coração de Boi foram meus companheiros e irmãos por mais de ano. No grande quintal que era o meu continente, me ouviram confidências, criancices, sonhos, enquanto me davam sombra, frutos e aventuras.

                Nas várias cidades onde morei, presenciei tempos bons, menos bons e ruins, principalmente em decorrência de escassez de chuvas, viroses e fatalidades. Mesmo nessas adversidades, sempre estiveram lá as mangueiras, repletas de frutos, como se estendessem seus braços para oferecê-los a todos, independentemente dos bairros e de suas condições financeiras. Tão acessíveis que causaram até estranheza quando começaram a aparecer nas saladas de restaurantes populares ou chiques.


                Tenho para mim que as mangueiras, árvores, estão mais perto de Deus do que nós, humanos. Isso porque, tanto elas quanto as pedras, alcançam mais a sua plenitude no universo que nos cerca. As árvores cumprem o seu destino, dão sombras, madeiras, flores, frutos, chás, essências, remédios, são casas ou apoios para pássaros e outros bichos, além de ajudarem na pujança e purificação da natureza. Isso tudo, ali, nos lugares onde nasceram e onde geralmente vivem como guardiãs e morrem, sem buscarem outra aventura que não essa da própria existência, seus ciclos e servidões. Se nós, homens, fomos feitos à imagem de Deus, a nossa plenitude existencial está bem mais longe, já que caminhamos, pensamos, falamos e temos outros dons que nos fariam até mais completos do que as árvores, mas que, ao serem muito mal utilizados, acabam por nos deixar mais longe daquilo de plenos que poderíamos ser. Para mim, as pedras e as árvores existem e participam da existência de forma mais simples, objetiva, essencial, divina. Por isso, desde miúdo, me impressiona muito a generosidade quase perdulária das mangueiras.



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