AS
TEMPESTADES
D. Arbués
D. Arbués
Estive pensando e tentando entender um
certo fascínio que tenho pelas tempestades. Talvez isso tenha vindo das ocasiões de
chuva forte, quando meu pai ou minha mãe mandava que entrássemos pra debaixo da
grande mesa de refeições da família, que virava algo como um bunker, no meio da
enorme sala de piso de tijolos assentados no centro da casa. Como éramos em
muitos irmãos, essas ocasiões me davam uma sensação muito mais de cumplicidade,
excitação e diversão do que de medo. Os clarões de raios e barulhos de trovões
se misturavam às conversas que acabávamos inventando embaixo da
mesa.
Talvez isso tenha vindo das brincadeiras de
soltar barquinhos de papel na enxurrada com os outros meninos quando a chuva
terminava. Lembro-me de irmos seguindo os barquinhos, dentro da enxurrada, com
sapatos de borracha que esguichavam a água turva, amarelada, pelos furinhos que
tinham na parte de cima dos dedos. Era como se fosse um chuveiro pra cima. Divertido,
mas deixava um odor terrível quando secava.
Talvez isso venha também dos banhos
gelados que meu pai deixava que tomássemos na água da própria chuva, que ficava
por um bom tempo escorrendo generosa na bica do telhado de casa, no finzinho de
cada tormenta, tão logo cessassem os raios.
A verdade é que, mais à frente, cheguei
à conclusão de que a tempestade era uma senhora sisuda, mas justa, que igualava
a todas as famílias, pobres, remediadas ou ricas, caindo sobre suas casas com a
mesma intensidade, moderação ou fúria, sem exceção. Ela, volta e meia, vem
lembrar-nos claramente da nossa pequeneza humana, diante do poder da natureza e
do universo. Traz sinais e mensagens das forças e energias superiores.
Por isso também, quero crer que esse certo
fascínio nasceu da ingenuidade de um menino de família comum, mas que foi
ensinado a conviver com as tempestades e a ver a natureza como aliada, desde
que respeitada ou procurada na forma e momento certos.
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